Como ter uma boa ideia de pesquisa? Do problema à pergunta

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O início de uma pesquisa é uma das fases mais importantes e pode ser uma das mais difíceis. É comum ouvir dos alunos que não sabem por onde começar. Às vezes não têm nenhuma ideia mesmo; outras vezes têm tantas ideias que não conseguem se decidir.

A boa notícia é que existem maneiras simples desses obstáculos serem superados. Maneiras esses que já presenciei serem bem-sucedidas, seja por quem orientei ou de outros orientadores. Aqui apresento uma primeira parte de reflexões úteis para o aluno ter uma gerar boas ideias de pesquisa.

Tudo começa com um problema

Por mais teórica, complexa ou simples que seja, toda pesquisa resolve um problema. Essa compreensão é uma das bases do trabalho acadêmico e podemos notar que é algo simples e intuitivo.

Observe sua realidade. Todos os dias você esbarra em um problema. Não consegue abrir uma garrafa, precisa descobrir um endereço novo para cumprir uma tarefa ou não lembra mais da sua senha de email. Esses problemas (assim como todos os outros possíveis) precisam de uma solução.

Com a pesquisa acontece a mesma coisa. Toda ela tenta resolver um problema. Na medicina, entender o funcionamento de uma substância no corpo por meio de microscópios e experimentos pode criar o remédio para alguma doença (problema). Estudar como se alimenta a sociedade brasileira pode ajudar os nutricionistas a criar melhores dietas e dar conta de taxas de colesterol muito altas dos seus pacientes (problema). E notem como a pesquisa se torna naturalmente mais clara e importante quando entendemos que ela soluciona algo.

Assim como todo problema nos leva a buscar uma solução, identificar problemas no mundo pode levar o aluno a imaginar uma solução por meio de uma pesquisa. O problema é que nem sempre é fácil encontrar um problema.

Isso acontece porque pode acontecer de estamos vivendo no “piloto automático”. Vamos pulando de obrigação em obrigação, de diversão em diversão e não refletimos profundamente sobre a vida ao nosso redor. Para encontrar um problema é preciso parar um pouco, observar o mundo e se perguntar: o que as pessoas têm dificuldade em fazer? O que é difícil para mim? O que eu ou os outros não conseguimos resolver? O que governos, empresas, grupos sociais, profissionais, cidadãos, cidades, países estão tendo dificuldades em resolver?

A pesquisa não acontece apenas observando ideias, mas também observando o mundo ao nosso redor

Esse problema a que me refiro é o problema de pesquisa, famoso por estar em toda pesquisa. Uma vez que o encontremos, o próximo passo é dividir ele e encontrar uma parte que nós possamos resolver com os recursos que temos, como tempo, dinheiro e conhecimentos até chegarmos em uma pergunta de pesquisa que represente bem o que queremos resolver desse problema.

A oportunidade ao meu lado

Vou usar mais uma vez um exemplo de minhas pesquisas. Constantemente eu observo um problema na região onde moro: sentia uma sensação de insatisfação com as experiências de baixa qualidade dos serviços. Noto, por exemplo, o que acontece nos restaurantes. Muitos deles tem cardápios e ambientes parecidos; os atendentes não tratam os consumidores com atenção e educação; faltam informações sobre pratos e assim por diante.

Note que a baixa qualidade dos serviços é um problema muito amplo. Quando reflito, penso que essa baixa qualidade pode ter um outro problema menor associado: os empresários têm uma visão de negócio ultrapassada, é difícil conseguir profissionais capacitados, os impostos impossibilitam investimentos, os clientes não estão dispostos a pagar por um serviço de qualidade e por aí vai.

De vários problemas menores possivelmente relacionados, imaginei que poderia dar conta de um que se refere a como as empresas não entendem bem as experiências dos consumidores e, por isso, não têm condições de melhorar. Naturalmente, já consigo imaginar uma solução simples: fazer essas pessoas entenderem como acontecem as experiências em seus estabelecimentos.

É possível encontrar problemas em qualquer lugar, até quando nos divertimos em um restaurante

E como fazer eles entenderem essas experiências? Com uma pesquisa! Um estudo que poderia envolver entrevistas com clientes falando sobre o que gostam ou não gostam em determinado estabelecimento. Claro que, para ser mais específico ainda, teria que escolher um tipo de serviço, até mesmo como já citei, restaurantes, ou ainda mais especificamente, restaurantes de comida japonesa. Quem sabe ainda escolher apenas um restaurante para analisar. A ideia é ir subdividindo, especificando, fazendo um “recorte”, criando pedaços menores do problema até chegar em um que o pesquisador consiga resolver com os recursos que tem, com o tempo que tem, conhecimento, rede de contatos e recursos financeiros disponíveis.

Notem que tudo começou com um problema. Eu tinha uma percepção de que a experiência dos serviços era de baixa qualidade. Após alguma reflexão, consegui chegar em uma solução para esse problema: descobrir e mostrar como acontece uma experiência do consumidor em um restaurante de comida japonesa. Só falta uma coisa para fecharmos essa tarefa.

Não custa nada perguntar…

Do mesmo modo que um esforço de encontrar uma solução surge diante de um problema, uma pesquisa vai naturalmente tomar forma diante de uma pergunta. Com já mostrei para vocês aqui no site, pesquisar é sobre descobrir, sobre entender melhor alguma coisa para gerar conhecimento, e a pergunta ou uma “?” é uma das melhores maneiras de levar o ser humano querer descobrir ou entender melhor algo. É por isso que, quando queremos saber alguma coisa, perguntamos a alguém!

O que parece óbvio se torna um grande problema para muitos alunos. Mas, entendam, a pergunta de pesquisa é como uma pergunta normal, mas que ajuda o pesquisador a entender o que ele quer saber para pensar em como ele vai criar a pesquisa.

Notem a conclusão a que cheguei quando refleti sobre a solução para o problema de baixa qualidade de serviços: “descobrir e mostrar como acontece uma experiência do consumidor em um restaurante de comida japonesa”. Essa “solução” indica que eu preciso descobrir algo, entender melhor algo e, como vimos, esse pensamento nos leva uma pergunta, que poderia ser: “como acontece uma experiência do consumidor em um restaurante japonês?”.

Notem como essa pergunta já me leva a pensar que eu poderia entrevistar consumidores de restaurante japonês para entender como eles vivenciam o estabelecimento ou até mesmo observar eles durante o consumo e perceber algum problema ou algo que gostem. Viram como a pergunta já me levou a pensar na coleta de dados?

Então, meus amigos, sua primeira tarefa para ter uma boa ideia de pesquisa é encontrar um problema; a segunda tarefa é especificar esse problema e ter uma pergunta de pesquisa! Tente já conversar com seu orientador com algumas perguntas de pesquisa em mente, ele vai ficar feliz e surpreso com seu domínio da pesquisa, além de fazer com que sua definição de pesquisa ocorra mais rapidamente e com menos desgaste.

Apesar de tudo isso ser útil há alguns segredos que aprendi que ainda gostaria de compartilhar com vocês em outro texto, com dicas de como escolher um problema que facilitar a vida do aluno. Até a próxima!

Professor Rodrigo

Doutor em Administração, professor e pesquisador há mais de 10 anos.

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