Como entender o valor experiencial?

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Quem já ouviu em alguma conversa poética sobre o dinheiro que algumas coisas “não têm preço, têm valor”? O valor é uma dessas coisas que extrapolam nosso entendimento do mundo e de como o mercado funciona.

Afinal, o que as pessoas querem em um produto? O que um produto precisa ter para que as pessoas o comprem? A partir desses questionamentos e da literatura disponível construí minha visão do valor experiencial e conto um pouco para vocês com o exemplo do smartphone.

O que é valor?

Em uma revisão de vários estudos sobre o assunto, encontrei uma definição que sintetizada diversas outras. O autor deste estudo trazia 4 possíveis conceitos, dos quais eu destaco um pela sua simplicidade e utilidade: valor é tudo aquilo que as pessoas querem em um produto. Ou seja, um produto valioso é aquele que tem o que as pessoas querem.

A simplicidade dessas frases é aparente porque, no fundo, escondem profundas reflexões. Pensemos: como assim o que as pessoas querem? Um cheiro? Um benefício? Preço baixo? Muitas opções? Tudo isso pode ser valioso.

Imaginem um smartphone. As pessoas querem tirar fotos, registrarem seus momentos e compartilharem com amigos. Nesse caso, um smartphone valioso é aquele que entrega a possibilidade de tirar fotos, com câmeras que tragam o máximo de qualidade às imagens. O valor aí está nessa capacidade do produto de captar imagens que é desejada.

A profundidade do assunto está nas infinitas possibilidades de valor. Ainda pensando num smartphone. Podem haver pessoas que não querem câmeras, preferem que a bateria carregue rápido. Ou podem existir pessoas que nem queiram muitas funções no smartphone, mas propriedades de estética ou status. Organizar todas essas informações e transformá-las em produtos é mais do que é uma técnica, é uma arte, uma exercício de compreensão humana e inovação tecnológica.

A ampliação experiencial

A ideia de valor nos aproxima de uma visão comum dentro dos estudos de inovação. A de que produtos têm “funções”, que trazem “benefícios” e assim por diante. Tais noções fazem parte de uma visão derivada de produtos materiais e parâmetros quantificáveis.

É como se toda vez que pensássemos em valor, imaginássemos produtos parecidos com carros. O que as pessoas querem em um carro? Querem que ele seja econômico e, por isso, vão buscar informações sobre como o motor funciona, quantos litros de combustível consomem por quilômetro, sem tem as funções de ar-condicionado, vidro elétrico e assim por diante.

Entretanto, essa visão esquece da complexidade do ser humano. As pessoas compram carros não só pelas suas funcionalidades, mas também, pelo que fazem as pessoas sentirem. Um carro com preço elevado por fazer os clientes se sentirem especiais, como partes de um clube seleto que desfila nas ruas seu prestígio. Ou, um carro grande e com design robusto pode fazer seus motoristas se sentirem fortes e viris. Essas sensações ou, até mesmo, ilusões, diferem da visão concreta, cheia de benefícios. As sensações fazem parte do que conhecemos como experiência do consumidor.

O carro têm interpretações humanas profundas que afetam a experiência

Mas, alto lá. Antes de acharem que a experiência é algo revolucionário, melhor que a visão funcional, calma. A ideia de experiência do consumidor é “evolutiva”, isto é, não destrói o que vem antes dela. Sendo assim, a visão funcional faz está inclusa na experiência do consumidor, que apenas amplia sua perspectiva. A ideia é que quanto mais elementos diferentes forem considerados, melhor visão se terá da realidade complexa da vida humana no consumo.

Valor + Experiência = Valor Experiencial

Feita toda essa explicação, já é possível entender o que entendemos por valor experiencial. É a compreensão de tudo que as pessoas querem num produto além das funcionalidades, incluindo todas as reações desses consumidores de modo a compreendê-los em toda sua complexidade e profundidade.

Diante disso, temos outro problema. Se formos considerar tudo isso que está em jogo, poderíamos ter informações demais e caóticas. É preciso uma ordem clara para dar sentido a toda essa riqueza de informações naturais da vida humana.

Por isso, nos meus estudos sobre inovação e experiência do consumidor, cheguei a conclusão de que existe uma maneira útil de entender essa rica dinâmica com apenas alguns elementos. É observando e analisando alguns conceitos na realidade que podemos entender melhor onde está o valor nas experiências.

Mapeando valor experiencial

Primeiro, todo consumo tem um objetivo por trás dele. Na verdade, podem existir vários objetivos e cada um deles pode nos apresentar insights sobre como funciona a experiência.

Por exemplo, qual o objetivo ou a razão de alguém comprar um smartphone? Se compra para trabalhar, vai querer funções diferentes de alguém que quer para jogar, por exemplo. As sensações são também diferentes. Usar o celular para o trabalho pode estar associado ao dever e compromissos, despertando seriedade e stress. Diferente de um celular comprado para a diversão.

Segundo, o que pode acontecer na experiência com um smartphone? A experiência pode ser observada como um filme em que os diferentes acontecimentos dividem a experiência em partes menores, em cenas que podem ser lineares ou não.

Podemos ligar, usar aplicativos de conversa, compartilhar fotos e assim por diante. Podemos ter momentos em que não prestamos muita atenção na tela, como quando estamos perto de dormir, ou momentos felizes, como é o caso de receber uma boa notícia pelo aparelho.

Em cada cena podemos pensar que há itens que despertam o gostar ou não gostar do consumidor. Existem coisas que dão prazer, outras não; existem dificuldades ou facilidades; coisas que vão despertar experiências agradáveis ou desagradáveis.

Imaginem a cena de compartilhar fotos. O que podemos gostar ou não nessa cena? Podemos gostar que tudo funcionou rapidamente; podemos não gostar que a imagem tem cores distorcidas; podemos gostar que registramos um momento com nossos amigos; podemos não gostar de alguém que odiamos estar na foto.

É no gostar/não gostar que está a primeira camada de valor. Quase que como as funcionalidades dos produtos e serviços organizadas em cenas, elas mostram o que as pessoas querem na experiência. No caso de smartphone, podia ser a aunção rapidez, função colorido, registro de momentos ou pessoas.

Tudo que gostamos ou não gostamos nos podem despertar emoções, pensamentos e assim por diante, isso é o que chamo de reações experienciais. São todas as reações dos consumidores ao que eles gostam e não gostam, é uma das maneiras de aplicar a visão experiencial ao modelo.

Por exemplo, na cena de compartilhar fotos no smartphone e tudo acontece rapidamente pode gerar uma sensação de paz ou sucesso no cliente. Já na cena de registrar momentos, o cliente pode ter um afeto profundo em ter para sempre o momento de sua formatura ou casamento.

As sensações são exemplos de reações experienciais

Até aí tudo parece estar claro e organizado, mas nem tudo são flores. O que as pessoas gostam ou não pode variar de acordo com quem é a pessoa e o momento que elas vivem. Alguém pode achar água muito sem graça, mas basta essa pessoa ser abandonada no deserto para mudar de ideia sobre o valor da água. Do mesmo modo que alguém pode gostar de suco de uva mas outra pessoa preferir o sabor da acerola

Esses problemas mostram que o valor varia de acordo com dois elementos: as características individuais e o contexto. Um smartphone branco pode ser o preferido de alguém e odiado por outro; um smartphone pode parecer estressante para um introvertido porque o põe em contato com muitas pessoas e um paraíso para alguém extrovertido pela mesma razão.

É a partir da análise desses elementos que podemos compreender melhor o valor da experiência do consumidor. Leia-se melhor como uma maneira de lidar com uma grande complexidade e profundidade de informações de maneira organizada e clara.

Essa é apenas uma amostra do mapeamento de valor experiencial. Fiquem ligados que tem muito mais pela frente!

Professor Rodrigo

Doutor em Administração, professor e pesquisador há mais de 10 anos.

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